Série Deuses: Danann parte 2
Muitos anos depois de escrever meu primeiro post sobre Danann, leia aqui, eu volto com novas informações sobre essa Deusa que muitos dizem que nunca existiu.
Sim pessoal, em 2017,quando eu fiz o post sobre Danann, foi um compilado de informações que eu achei na Internet sem acuracidade histórica e que muitas vezes eram apenas repetições das mesmas informações ou as mesmas fontes.
Hoje a minha proposta é trazer um fundo mais histórico para essa Deusa que muitos se referem como Danu.
Originalmente, ela é considerada uma Deusa das águas primordial e seu nome ser ligado a rios, reforça essa ideia. Na antiguidade, as civilizações se estabeleciam perto de rios, e era considerado um recurso vital.
Na cultura celta, é de conhecimento tanto arqueológico quanto mitológico que as águas eram fonte de vida, morte e renovação.
No Hinduismo, temos o conhecimento através dos Rigveda de uma Deusa das águas primordiais chamada Danu e que é a mãe de um povo, conhecido como Danava.
A origem de Danu:
Bom, como já é de se imaginar, não existe um mito original que defina com exatidão a origem dessa Deusa. O que temos hoje, são apenas pequenos fragmentos da cultura celta que fazer referencia a Danu, isso provavelmente se deve ao fato de que a cultura celta era muito mais oralizada, sendo que grande parte dos escritos são posteriores.
Hoje em dia, já é um consenso que Danu era realmente uma divindade céltica, pois temos o mito dos Tuatha de Danann, que pode ser traduzido como A Tribo de Danu, e provavelmente foi uma Deusa que não os acompanhou em sua chegada nas terras celtas, sendo uma Deusa "pré céltica".
Outro indicio de sua relevância, é a nomenclatura de vários rios regionais com o prefixo Dan, como o rio Danúbio. Em muitas culturas, temos o conceito de Deuses primordiais, que são "mortos" para que uma segunda geração de Deuses possa surgir, como por exemplo Tiamat, o que se encaixa com o que temos sobre Danu.
Quem é Danu?
Rio Danúbio |
Originalmente, ela é considerada uma Deusa das águas primordial e seu nome ser ligado a rios, reforça essa ideia. Na antiguidade, as civilizações se estabeleciam perto de rios, e era considerado um recurso vital.
Outro grande rio, é o rio Dom na Rússia, sendo Dom um nome derivado da palavra Dãnu, que significa rio.
Linguisticamente, seu nome significa Rio, água, etc, que provavelmente faz parte de uma matriz linguística indo-europeia, pois está presente em vários lugares, desde a Índia até a Rússia.
Aparentemente, seu nome não tem ligação direta com nenhum outro Deus celta, alguns estudiosos tentam ligá-la a Deusa Gaulesa Dôn, porém o gênero de Dôn não é bem descrito, deixando essa interpretação subjetiva.
A importância do culto as águas no paganismo celta
Rio Dom |
"Não é à toa que em vários textos antigos de defixio encontrados em Bath, seja nas lendas irlandesas e galesas, representam a morte, o retorno ao Não-Ser, como uma transformação em água. Não é à toa que todas as deusas celtas são sistematicamente identificadas aos rios correntes. O paralelo é perfeito entre microcosmos e a geração humana e o macrocosmo e a vida cósmica. A vida do homem é identificada ao calor vital e pode transmiti-lo através de seu esperma onde reside, segundo eles, uma parte desse calor; a mulher recebe o germe da vida que é o esperma macho e ela se alimenta até a encarnação perfeita dentro dessas águas placentárias. (Sterckx 1986: 81-82)."
Vemos então a grande importância do culto as águas, e podemos chegar a conclusão que Danu é a própria água primordial, a ideia de conhecimento, iniciação e poder da mulher sintetizada em uma única Deusa, ou uma mescla de várias Deusas das águas que foram sintetizadas em Danu. Esse culto as águas, era muito comum nas civilizações antigas, como a Índia.
Relações com a Índia
Danu (Hindu) |
No Hinduismo, temos o conhecimento através dos Rigveda de uma Deusa das águas primordiais chamada Danu e que é a mãe de um povo, conhecido como Danava.
"Danu (sânscrito: दनु, IAST: Danu) é uma deusa primordial hindu. Ela é mencionada no Rigveda como a mãe da raça homônima conhecida como danavas. A palavra Danu descreve as águas primitivas que esta divindade talvez incorporasse. No hinduísmo posterior, ela é descrita como filha de Prajapati Daksha e sua esposa Panchajani, e consorte do sábio Kashyapa."
"Como palavra para "chuva" ou "líquido", dānu é comparado a Avestan dānu, "rio", e posteriormente a nomes de rios como Don, Danúbio, Dnieper, Dniestr, etc. Há também um rio Danu no Nepal. A palavra "líquido" é principalmente neutra, mas aparece como feminina em RV 1.54."
Como bem podemos observar, há uma grande relação entre a mitologia da Deusa Danu Celta e a Hindu, fazendo que possamos afirmar que o culto a essa Deusa das águas primordiais esteve presente em toda a porção indo-europeia.
Oferendas clássicas:
De acordo com alguns achados arqueológicos, podemos pressupor que suas oferendas estão ligadas aos rios, como por exemplo jogar joias ou coisas preciosas em rios, fazer libações com águas e sacrifícios.
"Richard Bradley diferencia o sacrifício da oferenda:
Sacrifícios – requerem vítimas vivas – o sacrifício muda a natureza das coisas sendo sacrificadas. Oferendas – requerem objetos inanimados – a oferenda não muda a natureza das coisas sendo oferecidas."
"O lago sagrado de Tolosa (Toulouse) era um centro de romaria dos povos vizinhos aos tectósagos, sobre o qual havia duas versões. A menos crível para Estrabão seria a de Timageno, que dava o butin de Delfos como a origem dos tesouros. A outra versão, mais digna de crédito, relatada por Posidônio, revela que os tesouros eram metais preciosos em estado bruto que os celtas das redondezas traziam para atirar no lago. Os dados arqueológicos recentes demonstram que os gauleses do sudoeste da Gália e da Aquitânia, em particular produziam grandes quantidades de ouro de suas minas (Brunaux 2000: 122-123). Vale ressaltar que a natureza dessas oferendas atiradas ao lago possuía um caráter extremamente sagrado. Isso se levarmos em conta os relatos de alguns autores a cerca da sacralidade de certas oferendas que não deveriam ser tocadas e que ninguém ousava tocá-los."
"Objetos atirados em lagos, rios, fontes e outros cursos d ́água costumam ser encontrados. Entre alguns exemplos temos: a fonte termal de Chamaliers (Puy-de-Dôme) e as nascentes do rio Sena (Côte d ́Or) ambas tidas como sagradas e com propriedades curativas eram objeto de romaria (Green 2002: 28-29). Em ambas há a incidência de uma grande quantidade de estátuas de madeira que retém. Em La Tène, no lago Neuchatel (Suíça), também há uma grande concentração de objetos votivos como armas, onde uma plataforma de madeira teria sido construída para permitir o lançamento de oferendas no lago. O ponto alto dessa prática teria sido em torno de 100 a.C. (Green 2004: 142). Na Britânia, Llyn Cerrig Bach, em Anglesey, é um importante local em que oferendas foram encontradas e concentram-se no período do século II a.C. ao I d.C. (Green 2004: 142-143). De acordo com Miranda Green (1997: 223-224), os celtas tinham fascinação pela água. A grande quantidade de objetos atirados em cursos de água atesta que as águas tinham um papel crucial no culto dos povos celtas."
Esse culto as águas teria sobrevivido mesmo depois da cristianização, sendo que há indícios posteriores a Era Comum.
Culto moderno
Não é incorreto afirmar que o culto a essa divindade passou por transformações através do tempo, sendo associada a maternidade, vida, morte, natureza e etc, sendo provavelmente uma resignificação das águas primordiais.
Hoje seu nome está associado a sabedoria e conhecimento, o que pode ser algum resquício do significado subjetivo das águas primordiais.
Não existe fonte de onde pode ter surgido sua associação a Deuses celestes, mas faço aqui a especulação que seja algo como o oceano cósmico.
Tudo que temos hoje relacionado a oferendas, datas comemorativas e supostos mitos de parentescos, são tardios, o que não quer dizer que não podem ser usados. Resignificar o culto a Danu é uma forma de mantê-la viva, dando novos atributos, oferecendo outras coisas e vivendo a espiritualidade da forma que nós mais nos adaptamos.
Conclusão
A ideia aqui não é fazer com que você abandone seu culto, ou jogue fora tudo o que deu certo para você - E a Deusa - ao longo do tempo, é mais uma reflexão e exploração histórica das origens dessa Deusa que é tão antiga quanto os primeiros povos indo-europeus e que seus resquícios estão tão pungentes em seu grande lar, os rios.
Fontes:
https://en.wikipedia.org/wiki/Danu_(Hinduism)
https://en.wikipedia.org/wiki/Danava_(Hinduism)
https://www.vikingceltic.fr/pt/blogs/news/dana-deesse-celte
https://www.academia.edu/14173089/Religi%C3%A3o_e_Mitologia_Celta_breves_considera%C3%A7%C3%B5es_sobre_o_mundo_simb%C3%B3lico_e_ritualista
https://ppg.revistas.uema.br/index.php/brathair/article/viewFile/559/483
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